sexta-feira, 27 de maio de 2011











O Artur Patrício

Artur Patrício ficou órfão de pai aos sete anos. A sua ascendência beirã era humilde. Seu pai nasceu em Taberna Seca e sua mãe em Benquerenças de Igreja, distando esta aldeia, aproximadadente, dez quilómetros de Castelo Branco. Enquanto adolescente, terá feito um pouco de tudo na vida. Contava que havia sido submetido a trabalho muito escravo, mal remunerado e que a sua condição de rapaz humilde e trabalhador era quase sempre incompreendido. escola da sua vida foram as
ruas de Lisboa. O marçano da cidade alfacinha teve o ensejo de conhecer e conviver com gradas figuras da vida artística lisboeta e, em consequência, surgiram algumas oportunidades de aparecer como figurante numas quantas peças teatrais. Só aos trinta e três anos surgem a aprendizagem e o gosto pela fotografia, mas, muito a tempo de se deixar seduzir definitivamente por ela. Em Lisboa, na Rua Garret, 48, desenvolveu na década de cinquenta o comércio de livros usados, cujo estabelecimento era designado por Alfarrabista Bocage.

Artur Patrício foi ao longo de mais de quatro décadas, uma figura quase indissociável das épocas de veraneio de Vidago. O seu já raro cabelo, presentava-se, não raramente, desgrenhado,facto que lhe conferia um certo ar de dientista. Não dispensava o seu Papillon como atavio. Era uma figura fisicamente franzina, jovial, respeitada e respeitadora. Amava a serenidade, a simplicidade e a pacatez desta gente. Por isso, elegia esta terra para gozo das suas férias de Verão, aliando ao lazer aqui disfrutado, a oportunidade de desenvolver algum comércio inerente às suas actividades de alfarrabista e fotógrafo. Homem de parcos recursos, hospedava-se normalmente na Pensão Santos ou em discreto quarto particular, que alugava para seu aposento, durante a sua permanência na estância termal, comendo onde melhor lhe cheirasse! Muito virtuoso, verdadeiro autodidacta, foi alfarrabista de nomeada. Não só vendia livros, como também oferecia exemplares, generosamente, a pessoas que ia conhecendo, nas noites românticas de entretenimento, passadas nos hotéis e pensões de Vidago, em verões inesquecíveis. Também gostava de fotografia. A sua velhinha máquina, de fole enorme, deliciou muita gente que se deixou apanhar pela sua oportuna objectiva. Depois, não só vendia as fotos, como também sentia um prazer enorme em oferecer algumas aos seus amigos, que podiam ser antigos ou simplesmente de ocasião. Aliás, a generosidade era em Artur Patrício uma faceta muito conhecida de todos. Recorde-se que frequentemente organizava e realizava festas, cuja receita fazia questão de atribuir a uns quantos pobres da terra, por si eleitos como merecedores da sua benemerência.
Excelente declamador, gostava de teatro e fazia questão de representar de modo muito peculiar. Com uma versatilidade incrível, sozinho, representava uma peça. Dispunha umas quantas cadeiras, como se de verdadeiros personagens se tratasse e emprestava-lhes os seus gestos e a sua voz, conferindo-lhes, "A Ceia dos Cardiais" mais gostava de representar a respeito que gostava de  representar e repetia anos a fio, vezes sem conta! Quem não se recorda de o ouvir, de cabelos desgrenhados, rodopiando, a declamar o inolvidável poema  e ovento é bom bailidos" Nas décadas de cinquenta e sessenta, fez as delícias dos residentes e visitantes de Vidago, que tiveram o privilégio de comungar da sua inolvidável, singular e lúdica companhia. Jamais será esquecido por aqueles que tiveram a oportunidade de o conhecer, pois entre todos deixou uma grande saudade e milhares de momentos e pessoas perpetuados em fotos imorredoiras.
 
in Memórias de Vidago - 2004
Floripo Salvador

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