sábado, 3 de março de 2012


O Adolfo “Pica-Pau”

Lindolfo Dinis Baralho de seu nome completo, apenas era conhecido por Adolfo ou simplesmente Dolfo, ou ainda Pica-Pau e Adolfo dos Bois. Nasceu em Vilarinho das Paranheiras, aqui bem perto de Vidago. Seu pai chamou-se João Baralho e o Adolfo teve ainda mais dois irmãos – O Modesto e o Rosinha. Os três filhos de João Baralho nasceram com  acentuada deficiência mental a que não será estranha, ao que consta, estreita consanguinidade dos seus progenitores.

Quando tinha vinte e tal anos,  Adolfo veio para Vidago. João Custódio possuía uma propriedade em frente ao antigo tanque na Estrada Nacional Nº.2, perto do entroncamento para Boticas,designada por Brinhosa. De modo informal, João Custódio convidou o Adolfo a ir trabalhar para casa da sua família. Nessa altura, os sete filhos de Domingos Ferreira e Generosa, eram todos solteiros. No seio desta família, o Adolfo haveria de ficar para sempre. Assistiu ao casamento de Alice Ferreira e partilhou a criação dos seus cinco filhos com um amor e dedicação muito fortes.
As suas acentuadas limitações mentais, contrastavam com o sua pujança física. Muito desajeitado no amanho agrícola, víamo-lo feliz naquilo que talvez melhor sabia executar: de aguilhada na mão guiando os carros puxados pelos possantes e pachorrentos bois dos Custódios, estrada fora, a caminho dos campos.

Provavelmente, guiou os últimos carros de bois que se ouviram chiar em Vidago! Releve-se uma atitude muito peculiar do comportamento do humilde Adolfo:  frequentemente, regressava do campo, carregando pesado molho de milho ou de qualquer outro alimento para os animais, a fim de estes serem pensados de noite. Num qualquer ponto da vila, parava, indiferente à carga que o fustigava. Se alguém lhe perguntava das razões de estar ali especado, o Adolfo, invariavelmente, respondia: estou a descansar!

O Adolfo alimentava-se, ao que consta, abundantemente. Sentia, o prazer do cigarrito que fumava e no copito que bebia de um só trago, o auge da sua felicidade terrena. Pessoalmente guardo do Dolfo, uma recordação que jamais se varrerá da minha memória: estávamos em Outubro de 1989 e nos últimos dias da sua vida, o meu pai estava melancolicamente sentado numa cadeira no cimo das escadas, já indiferente a quem passava à sua porta, ainda que fosse interpelado. Mas eis que na estrada parou o Adolfo, olhando para cima e proferindo a habitual provocação:
Oh Zaneiro, atão, o cegarro, o copo, malandro, tás a dormir!… Foi então, que num grande esforço, o meu pai esboçou um sorriso, balbuciou o seu nome, levantou um braço e acenou ao amigo! Era o último trocadilho afectuoso entre ambos! Daí a uns dias, o Adolfo, na sua pose fisicamente desconjuntada e simples, incorporava o numeroso cortejo fúnebre do seu amigo Zaneiro.

Mais tarde, se encontrava alguém da família do Zaneiro, perguntava sempre: O amigo? O amigo? Coitadinho!… Coitadinho!…

in Memórias de Vidago - 2004
Floripo Salvador

4 comentários:

António Barreira disse...

Bela descrição do Adolfo.
António Barreira

A. PEREIRA disse...

O ADOLFO MEREçE ESTA "PAGINA"TUDO ISTO É VERDADE...POSSO-O COMPROVAR ALÉM DE VISINHO FREQUENTEI A CASA DO SR. CUSTODIO COM OS QUAIS EXISTIU E EXISTE UMA BOA AMIZADE....
SO FALTOU REFERIR QUE O ADOLFO "GOSTAVA MUITO DE CRIANçAS...MESMO POR VEZES QUE O FAZIAM CHATEAR...NUNCA FEZ MAL A NENHUMA....RECORDO-O COM MUITO CARINHO....

lobo da silva disse...

Fazia parte da familia da R. Gen.
Sousa Machado. Marcou pelo menos quatro gerações. Espero que esteja melhor, do que esteve na vida terrena.

Maria Nazaré de Souza Oliveira disse...

Adolfo! Oh, o Adolfo! Grande, forte, desajeitado, mas bondoso e puro.
Fez parte da minha infância, tal como a família que o acolheu.
Perfeitamente de acordo com o comentário anterior.
Belo texto, belo retrato de um homem grande, forte, desajeitado, mas bondoso e puro.
Adolfo "pata negra", como lhe chamava carinhosamente um tio meu, belga, quando vinha a Vidago e o encontrava.