terça-feira, 25 de novembro de 2014




    HOTEL DO GOLFE

Foram décadas de história
Marcadas na nossa memória!
Quantas recordações
De aquistas e veraneantes
Quantas ilusões
Trocadas por amantes!

Um dia, tudo o fogo levou
E todo o esplendor
Do que foi uma bela flor
Enfim, se esfumou!

Eis agora o que resta!
Um paraíso em escombros
Erigido por humanos ombros
Em tempos que foram de festa!

Quando com ele cruzamos
E o seu fulgor recordamos
Sentimos a nostalgia
Do que de belo ali havia!

São décadas de tristeza
Que apagaram tanta beleza!
Grandes plátanos chorosos
Aguardam ansiosos
A humana piedade
Consentânea com a sua idade!

Haja, porém, a ilusão
De que nem tudo está perdido!
Outros homens virão
E no lugar que está ardido
Ressurgirá um hotel novo
Para alegria do povo!

Floripo Salvador
Novembro 2014


(Bilhetes postais e fotografias de Júlio Silva)

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Vidago, na Baixa do Porto!

Na Baixa do Porto há algumas "Mercearias Finas" que apostam no comércio de produtos de outras regiões. Do fumeiro ao mel, das compotas ao artesanato e peças decorativas, as lojas procuram divulgar e trazer aos portuenses um pouco da sua tradição. Uma dessas mercearias chama-se "Comer e chorar por mais" e é uma das casas mais antigas da cidade do Porto. A loja, onde ainda prevalece um ambiente do princípio do século XX, é conhecida pelos produtos transmontanos.

Já há alguns anos, no início de Novembro, é possível encontrar nozes transmontanas, e de Vidago!

Este ano não resisti e lá fui eu perguntar à funcionária mais antiga da loja, Conceição Ferro, se as nozes eram mesmo de Vidago ou dos arredores.

Conceição Ferro respondeu-me:
 -Sim, as nossas nozes são de Vidago! E o Senhor conhece Vidago?
- Conheço sim, minha senhora!
- Então, se conhece, estas nozes são do Sr. Rui, filho do falecido Sr. Lopes, e são um luxo!
- Obrigado, fiquei contente em saber. Não vou comprar mas posso tirar uma fotografia?
- Claro, só pelo ar de felicidade do senhor, pode tirar as que entender!

E, lá tirei do bolso o meu “smartphone” para fotografar as belas nozes de Vidago!



Parabéns ao Rui Lopes por conquistar, com as suas nozes, uma das “Mercearias Finas” mais procurada e visitada da Baixa Portuense.



A loja fundada em 1912, na rua Formosa, já foi papelaria, casa de cafés e chás e mercearia. Em 1970, passou a loja de produtos alimentares e até hoje só vende produtos nacionais. Em 2013, "Comer e chorar por mais" foi distinguida pela "Revista dos Vinhos" como a melhor casa de produtos regionais do país.

Um abraço e até breve...

sexta-feira, 14 de novembro de 2014



Vidago (Rio Pequeno)

Desce, desde tempos ancestrais
De terras de Lagarelhos
Banhou hortas e cereais
Sustentou novos e velhos!

Quantos terrenos agricultados
Foram por ele regados
Quanto pão se criou
Quanto estômago se saciou!

Prateados cardumes ali viveram
Quantos homens ali pescaram
Quantas merendas se comeram
Em tempos que não voltaram!

Em cálidas tardes de Verão
Quantos meninos sem mar
Vestindo humilde calção
Ali aprenderam a nadar!

Quantas mulheres lavaram
À sombra de choupos e negrilhos
Roupa que sujaram
Os maridos e os filhos!

Que saudades das noras
Das suas pancadas sonoras
E dos pachorrentos asininos
Que encantavam os meninos!

Quantos melros e cotovias
Rouxinóis e outras aves
Entoaram belas melodias
Que nos deixaram saudades!

Tem nome de “Pequeno”
Para Vidago foi grande e sereno.
Sê-lo-á por décadas a fio
O nosso querido rio!

Floripo Salvador
Novembro 2014



(montagem de postais antigos - Júlio Silva)

domingo, 9 de novembro de 2014

Antigas casas comerciais

Hoje publico duas páginas do Almanaque de Chaves de 1949, que contém publicidade de antigas casas comerciais de Vidago. Muitas pessoas ainda se recordarão delas, eu ainda recordo algumas!





Agradeço ao amigo F. Cadete a gentileza pela oferta deste Almanaque, um bem haja!

Um abraço e até breve,

terça-feira, 4 de novembro de 2014

Cruz Caldas, o publicitário ao serviço da VM&PS (7)


VOZ

Coimbra, 6 de Abril de 1943

Era o céu que sorria nos seus olhos,
Eram junquilhos trémulos aos molhos,
As flores do rosto que eu beijava.
Fresca e gratuita como um hino à lua,
Nua,
Era um mundo de paz que se entregava.
Oh! perfume da Vida! – gritei eu.
Oh! seara de trigo por abrir,
Quem te fez todo o pão da minha fome?
Mas, os seus braços, longos e contentes,
Só responderam, quentes:
- Come.

           Miguel Torga, "Diário II"



Esboço a aguarela para publicidade às Águas de Vidago, por Cruz Caldas enquanto empregado, litógrafo maquetista, na Empresa do Bolhão, no Porto.

Um abraço e até breve...

segunda-feira, 3 de novembro de 2014



O Cemitério de Vidago


(Fotografia de Augusto Oliveira)
Visitamo-lo de vez em quando. Sempre que um familiar ou um simples amigo parte, lá estamos, por imperativos sociais e morais, mas também por devoção. Sentimo-nos invadidos por uma força interior muito grande que nos impele ao derradeiro acompanhamento e ao último adeus. Por isso, lá vamos! Silenciosamente, ar pesado e triste, passada lenta e certa. De vez em quando procedemos à obrigatória romagem.

Sempre a existência humana se viu confrontada com a mais radical das situações limite: a morte! Na sua relação com o Criador, a dimensão espiritual do crente vai-se manifestando em palavras e atitudes, actos e gestos. A morte é, de facto, um evento único e irrepetível na vida de cada ser humano! É, pode dizer-se, o horizonte natural da nossa existência. Independentemente da religião que professe, o homem sempre haverá de venerar os seus mortos. Sempre providenciará o seu enterramento, dignificando, consoante a sua mentalidade e também as suas posses económicas, os que desta vida vão partindo!

Quando se chega à minha idade e o cabelo começa a ficar pigarço, toma-se mais consciência da verdadeira realidade que somos e do destino que cada um de nós tem, neste mundo. Ocorre-nos mais frequentemente a incontestável ideia de que, cada dia que passa é menos um neste encontro com Deus. Neste encontro com o infinito - podemos afirmá-lo! Para muitos crentes, e não só, existe vida para além da morte. Respeitemos essa ideia! Porém, o que nos parece inquestionável é o facto de existir morte para além da vida! Mas, tudo isto está muito bem feito! Quase perfeito, diria mesmo! O avanço na idade se por um lado nos pesa (e a muitos de nós aflige porque arrasta, paulatinamente, consigo a debilidade física e a doença) confere-nos, por outro, uma faculdade maravilhosa: uma perfeita resignação ao implacável destino! Aceitamo-lo naturalmente! Isto permite-nos concluir, que Deus não dará, certamente, tudo o que pretendemos. Mas, com toda a certeza, não nos tirará tudo, também.

O avanço na idade vai-nos preparando, quase sem nos apercebermos, para tudo o que faz parte da nossa humana existência. Para a vida e também para o que poderá existir para além dela. Assim, para quem é minimamente crente a Deus, o cemitério não é um lugar muito diferente de uma sumptuosa catedral, de uma simples igreja ou de uma humilde capela. Não direi que o devamos encarar, propriamente, como a nossa residência de hoje (que é efémera) mas, talvez, como a nossa casa futura, que é eterna. Afinal não somos, todos nós, meras figuras em trânsito? Não estamos por cá, mais ou menos, a prazo? Ali constatamos a real e implacável fragilidade da condição humana. É o local próprio para serem evocadas as palavras de Fernando Pessoa, através de um dos seus heterónimos - Alexander Search: Quando, depois da lâmpada quebrada / sua luz vacilante se extinguiu / mais que luz por ela derramada / fica a lembrança do que se partiu.

No cemitério jaz sempre alguém que esgotou a vida física que tinha e a quem quisemos muito. Uma ou mais lâmpadas que nos alumiaram até ao seu limite fisiológico: o pai, a mãe, o irmão, o filho, a esposa, o marido ou, simplesmente, o amigo que eternamente recordamos! Por isso, se não sentimos propriamente alegria por visitarmos o Campo Santo somos, pelo menos, invadidos por uma sensação de grande leveza espiritual que nos conforta e estimula a ali rumar. Também, por causa disso, o Santo Lugar é uma morada como outra qualquer. Apenas definitiva!

O cemitério encerra sempre uma boa parte da história dos seus naturais e dos seus residentes, em suma, a história da sua terra. É uma parte adormecida da localidade – podemos dizê-lo! Quando transpomos o Grande Portão e deixamos que os nossos olhos vagueiem pelo granito e mármore que escaldam no tórrido Verão, ou se apresentam enregelados em manhãs de Inverno, sentimos a estranha mas agradável sensação de folhear um livro sobre a nossa terra. A maior ou menor ostentação patenteada na ornamentação das campas recorda-nos que, à superfície, o cemitério não é, propriamente, um espaço de igualdade. Mas, cada foto, cada nome e cada data forçam-nos a efectuar uma retrospectiva no tempo. A conjugação destes testemunhos traz-nos à memória infinitas recordações, mais ou menos longínquas, mas sempre nostálgicas. Quantas vezes, aqueles três factores identificativos, nos fazem lembrar alguém que, há muito, quase se alojara, inexplicavelmente, no nosso subconsciente. E, naquele momento, a nossa mente faz emergir as memórias que, de facto e desse alguém, nunca perdemos. E, então, sentimo-nos nostálgicos mas reconfortados e felizes.

Não é exagerado dizer-se que o cemitério pode ser, também, um local de reflexão. É verdade! Ali, na presença de tantos ausentes, é o espaço próprio para reflectirmos um pouco sobre os nossos comportamentos que, enquanto estamos à superfície, temos perante os outros. Tantas invejas! Tantos ódios! Às vezes, quantos atropelos e quanta maledicência! Afinal tudo acaba ali. Submerso e silencioso! Quantas vezes, neste local, quando pensamos um pouco nisso, nos questionamos: mas então, o que é o Homem? O que vale, ou não, a pena?

O Cemitério de Vidago espelha um pouco a história passada da vila. A mais antiga e também a mais recente. As inscrições que observamos gravadas nas inúmeras lápides, desde as mais visíveis, porque mais recentes, até às mais remotas (já disfarçadas pela erosão do tempo) levam-nos a viajar numa época mais ou menos distante. Depois, lembramo-nos que ali está, inerte, tanta gente! Gente que foi cumprindo o calendário das suas vidas, uns mais precocemente que outros. Gente que teve algum protagonismo social e económico na terra. Mas, também, gente mais discreta, humilde e quase anónima, mas não menos digna que a restante. E toda essa gente, de um modo ou de outro, com maior ou menor protagonismo, deu o seu generoso contributo para a história da vila. Uma história inapagável!

A edificação do Cemitério de Vidago remonta a 1890 e deveu-se, em boa parte, a substancial contribuição da família Borges, naquela altura proprietária da Farmácia Frederico. Esta família terá doado, para o efeito, terreno aos responsáveis autárquicos da época. Em contrapartida estes terão concedido à família Borges espaço para seis campas que se situariam à entrada do cemitério do lado direito. Mais tarde os descendentes da referida família terão abdicado a favor da Junta de Freguesia de três campas. Conta-se que os abastados empresários daquele tempo, João Oliveira e também Nicolau José Teixeira Alves terão contribuído, significativamente, para a edificação da obra. A preceder o Grande Portão, aquelas escassas dezenas de metros de estreita e íngreme ladeira transportam-nos a uma realidade que desejamos sempre distante, mas à qual, inevitavelmente, não fugiremos nunca.

O Cemitério de Vidago pode ser perfeitamente contemplado da parte mais elevada da vila. Mas também do seu interior se avista a parte mais significativa do aglomerado populacional num belo anfiteatro. Aposta na parte cimeira da grande laje, dali observamos a esguia, imponente e bela Torre do Coto, autêntico ex-libris da parte mais habitada da vila. Em dias de sol, o aglomerado populacional, quase compacto, da zona mais alta de Vidago apresenta-se-nos de uma beleza extraordinária. Em minha opinião, a edificação do Cemitério de Vidago naquele local foi de enorme felicidade e bom gosto dos seus promotores. Saibamos honrar a sua memória!

Floripo Salvador
Novembro 2014